“Pôs a chave na
fechadura. Ao girá-la, sentiu que morria uma parte de sua
vida, talvez a mais breve, irrepetível, a mais rara, a única
em que foi capaz de amar.”
Nascido numa estância no interior gaúcho, próximo à
fronteira com o Uruguai, Julius foi levado às pressas pelos
pais a São Paulo, ainda criança, em circunstâncias não de
todo esclarecidas. Um tempo depois, vê-se órfão e é criado
por tia Erna, professora de música. Quando jovem, graças à
herança dos pais, vai estudar violoncelo na Alemanha. O
homem que de lá retorna é um ser culto, mas meticuloso e
frio, e que padece de uma condição especial: é um observador
da própria vida, sempre distante, sempre elaborando frases e
diálogos mentais para si mesmo, incapaz de agir de forma
espontânea.
A fim de estudar uma composição clássica que o obceca há
trinta anos, Julius retorna em pleno inverno à estância
Júpiter, lugar onde nasceu, numa espécie de retiro
autoimposto. A decisão não apenas representa um retorno às
origens, como o obriga a visitar o próprio passado e as
próprias escolhas, no que se revelará, afinal, uma
verdadeira arqueologia dos afetos.
Tal jornada de Julius transita por diversos pontos do tempo
e do espaço – o pampa da infância, a vida em São Paulo, os
estudos na Alemanha, e o presente, incerto – e é ladeada por
figuras femininas cuja presença ou ausência moldaram a vida
de Julius: Sílvia, a esposa; Agripina Antônia, a meia-irmã
bastarda; e Constanza Zabala, seu amor de juventude.
Concluída a leitura de O inverno e depois e seu
surpreendente final, ressoa em nós a epígrafe que abre o
romance, de autoria de Jorge Drexler: Sobretudo, creio que
nem tudo está perdido.