Introdução

  • Luiz Antonio de Assis Brasil nasceu em Porto Alegre
    no ano de 1945, onde reside.

  • Romancista, ensaísta e cronista; Doutor em Letras [1987].

  • Catedrático convidado da Universidade dos Açores [1992].

  • Pós-doutorado em Literatura Açoriana [1992 - Universidade dos Açores].

  • Visiting scholar na Brown University, Providence [1998].

  • Distinguished Brazilian Writer in Residence.
    University of California - Berkeley [2000].

  • Conferencista nas universidades de Tübingen e Leipzig [2006];
    na Universidade Sorbonne, Paris [2007 e 2010];
    na Universidade de Toronto [2010].
     

Atividades Atuais

Professor Titular da Faculdade de Letras da
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
[Professor desde 1975].

Ministrante da Oficina de Criação Literária do Programa de Pós-Graduação em Letras da Faculdade de Letras da PUCRS, desde 1985.
[40 antologias publicadas].

Coordenador-Geral do DELFOS
Espaço de Documentação e Memória Cultural, da PUCRS.

Secretário de Estado da Cultura do Rio Grande do Sul.
 

Currículo Lattes

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Resumo biográfico

Nascido em Porto Alegre, em 1945, Luiz Antonio de Assis Brasil passa parte da infância em Estrela, com a família, que de lá retorna à capital em 1957. Cinco anos mais tarde começa a estudar violoncelo.

Em 1963 termina o Curso Clássico no colégio Anchieta, em Porto Alegre, dos padres jesuítas. Em 1964, ano do golpe militar, ocorre sua entrada no exército, para o serviço militar obrigatório. Um ano mais tarde Luiz Antonio ingressa no curso de Direito da PUCRS e também passa a fazer parte da OSPA - Orquestra Sinfônica de Porto Alegre – como violoncelista, lá permanecendo por 15 anos. Forma-se em Direito em 1970. Advoga por dois anos. Em 1975 ingressa como Professor na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, função na qual atua até hoje; no mesmo ano inicia a colaborar na imprensa com artigos históricos e literários.

Estréia em 1976 com o romance Um quarto de légua em quadro, lançando-o na 32ª Feira do Livro de Porto Alegre, e que lhe dá o Prêmio Ilha de Laytano. Em 1976 inicia sua trajetória de administrador cultural, primeiramente na Prefeitura de Porto Alegre [Chefe da Secção de Atividades Artísticas] e depois no Estado do Rio Grande do Sul [Diretor do Instituto Estadual do Livro - 1983]; 1978 é também o ano de lançamento de A prole do corvo. Em 1981 publica Bacia das almas. No ano seguinte, Manhã transfigurada. Em 1981 Luiz Antonio de Assis Brasil assume a direção do Centro Municipal de Cultura de Porto Alegre

No inverno 1984/1985 vai à Alemanha, como bolsista do Goethe-Institut [Rothenburg-ob-der-Tauber, na Francônia]. Em 1985 lança aquele que, segundo o autor, é seu livro com maior carga emocional, As virtudes da casa.

Em 1985 começa a ministrar a Oficina de Criação Literária do Programa de Pós-Graduação em Letras da PUCRS, em atividade até hoje, e que recebeu o Prêmio Fato Literário, da RBS/Banrisul em 2005, ao completar 20 anos de atividades ininterruptas.

Em 1986 sai mais uma obra, O homem amoroso, uma novela com forte acento autobiográfico. Cães da província, em 1987, retoma o ciclo histórico, adotando Assis Brasil o dramaturgo José Joaquim de Campos Leão, o Qorpo-Santo, como personagem e evocando os tenebrosos crimes da Rua do Arvoredo. O romance dá o título de Doutor em Letras ao autor e faz jus ao Prêmio Literário Nacional, do Instituto Nacional do Livro.

Em 1988 Assis Brasil recebe da Câmara Municipal de Porto Alegre o Prêmio Érico Veríssimo pelo conjunto de sua obra. Videiras de cristal, que recria a saga dos Muckers, é lançado em 1990. Nova experiência é o romance em três volumes Um castelo no pampa, que se divide em Perversas famílias [1992 - ganhador do Prêmio Pégaso de Literatura, da Colômbia], Pedra da memória [1993] e Os senhores do século [1994]. Concerto campestre, Breviário das terras do Brasil e Anais da Província-boi saem em 1997, ano em que o romancista é eleito Patrono da 43a Feira do Livro de Porto Alegre.

Em 1998 é palestrante convidado na Brown University, em Providence, USA e em 2000 participa do programa Distinguished Brazilian Writer in Residence, na Berkeley University, Califórnia.

Em 2001 publica O pintor de retratos, que recebe o Prêmio Machado de Assis, da Fundação Biblioteca Nacional.

Em 2003 lança o livro A margem imóvel do rio, o qual é contemplado com três prêmios: Prêmio Portugal Telecom de Literatura Brasileira [o único romance dentre os três primeiros classificados], Prêmio Jabuti [finalista menção honrosa] e Prêmio Açorianos de Literatura.

Ainda em 2003 acontecem três publicações no Exterior: O pintor de retratos sai em Portugal pela Editora Ambar, do Porto; O homem amoroso é publicado pela Editora l´Harmattan, de Paris [l´Homme Amoureux], e na Espanha, pela Editora Akal, de Madrid, lança a tradução de Concerto campestre [Concierto Campestre]. Também em 2003 publica um livro de ensaios literários pela Editora Salamandra, de Lisboa: Escritos açorianos: tópicos acerca da narrativa açoriana pós-25 de abril. Em 2005 sai na França, pela editora Les temps des Cérises, o Breviário das terras do Brasil [Bréviaire des Terres du Brésil.]

Em 2006, Assis Brasil participa, com conferências na Alemanha [Tübingen, Leipzig, Berlim] de programa oficial do Ministério da Cultura do Brasil.

Música perdida é lançado em 2006, o qual vence, em 2007, a Copa de Literatura Brasileira e recebe indicação ao Jabuti.  Em 2008 publica Ensaios íntimos e imperfeitos, uma coleção de pequenos textos de caráter poético e ensaístico.

Em 2010 segue com sua coluna quinzenal no jornal Zero Hora, de Porto Alegre, e profere conferências nas Universidades de Paris-Sorbonne e na Universidade de Toronto.

Em janeiro de 2011 é nomeado Secretário de Estado da Cultura do Rio Grande do Sul, sendo governador Tarso Genro.

Atualizado em abril de 2011

 

Entrevista com José Pinheiro Torres

José Pinheiro Torres - Começando pelo princípio: como foi sua formação?

Luiz Antonio de Assis Brasil - Pensando em formação escolar, esta foi de excelente qualidade. Estudei com os jesuítas, que possuem um colégio centenário em Porto Alegre. Os padres da Companhia estimulavam os estudos clássicos, a filosofia e a língua portuguesa. Já na adolescência eu lia Cervantes, Chateaubriand e Milton no original - e isso não é vantagem alguma, porque todos os colegas faziam o mesmo. Creio que esse foi o grande impulso para a literatura, embora em casa o ambiente não fosse estranho às letras. Tive a oportunidade, também, de estudar música: aprendi violoncelo e fui músico da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre. Todo esse conjunto de fatores, creio, já preparava o futuro romancista. Esquecia de dizer: tomei aulas de aquarela, mas não passei das garrafas e das maçãs.


JPT - Falando sobre a Orquestra Sinfônica: como foi a experiência?

Assis Brasil - Foram quinze anos dedicados à Orquestra da minha cidade; uma experiência importante, por vários motivos. Em primeiro lugar, pela consciência de que, em uma orquestra, o músico é um executante no sentido próprio do termo. A emoção e a paixão são do maestro e do compositor. Em segundo lugar, enquanto experiência social, esta é riquíssima. Vive-se, na orquestra, um ambiente bastante neurótico, porque se trata de um pequeno grupo no qual há muita competição em torno dos postos. Postos melhores significam salários maiores, e a partir desse fato se estabelece uma pesada hierarquia dentro da orquestra. E eu vivi esse clima durante a ditadura militar, quando havia enorme verticalização do poder. As coisas eram bem mais graves do que se pensa.


JPT - E isso deu livro?

Assis Brasil - Deu: O homem amoroso, uma novelinha.


JPT - O senhor então abandonou a música?

Assis Brasil - Jamais. Posso não praticar meu instrumento, mas hoje sou mais músico do que antes: não tenho mais, sobre mim, a tirania das notas musicais.


JPT - Quais as leituras ou autores que mais o influenciaram?

Assis Brasil - O primeiro romance que li por inteiro foi A relíquia, de Eça de Queirós. Só descansei quando não havia mais nada para ler desse autor. Depois, foi a vez de Flaubert, naturalmente com Mme. Bovary. E depois vieram Machado de Assis e Erico Verissimo. Em seguida, Balzac, Stendhal e Zola. Dentre os modernos e contemporâneos, estão Thomas Mann, Faulkner, Hemingway, Gide, Julien Green, Cortázar, Carpentier, García Márquez, Vargas Llosa, Saramago, Günter Grass, Pascal Quignard. Antes que essa relação se transforme numa lista telefônica, resta-me dizer que li e leio muito, e de modo assistemático, guiando-me pelo instinto ou pela sugestão de pessoas a quem respeito. Não me considero particularmente influenciado por nenhum destes, mas por todos em geral; se fosse imprescindível responder à pergunta, diria que Eça ainda está no cimo desse panteão particular: com ele aprendi, ou penso ter aprendido, como se estrutura um romance e como se desenvolve uma personagem.


JPT - O que pensa da literatura chamada pós-moderna?

Assis Brasil - Não acho nada, pois se trata de um momento estético e, como tal deve ser entendido. Particularmente, minha sensibilidade não chega a perceber como, em certo viés da pós-modernide, se construa um romance sem conflitos, conflitos sem personagens, personagens sem drama. Mas o futuro é que poderá estabelecer um juízo mais razoável.


JPT - Quando começou a escrever "profissionalmente"?

Assis Brasil - Em 1974 tive uma doença gravíssima, que implicou e internamento hospital, cirurgia, risco de vida, etc. Na convalescença comecei a escrever aquilo que seria meu primeiro livro, Um quarto de légua em quadro. Não tinha idéia do que se tratava. Minha intenção original era escrever uma obra histórica sobre o povoamento açoriano no Rio Grande do Sul. Pois virou romance, e desde aí não parei mais.


JPT - Por que Açores?

Assis Brasil - Explico: sou descendente de açorianos por parte de pai e de mãe. Assim, o que era um interesse genealógico acabou em interesse pelos Açores, minha segunda pátria, e onde tenho excelentes e fraternais amigos. Já dei aulas de Literatura Brasileira na Universidade dos Açores e lá fiz uma investigação de pós-doutorado.


JPT - A propósito: e a carreira acadêmica?

Assis Brasil - Encontrei-me no trabalho universitário. Tenho, ali, a possibilidade de conviver, de maneira mais palpável, com a literatura e seus autores. Não poderia fazer outra coisa. À parte disso, minha Universidade me propicia ministrar a Oficina de Criação Literária, que teve início em 1985 e que segue até hoje. Orgulho-me de meus ex-alunos, que por ali passaram, e que hoje são escritores reconhecidos pela crítica e pelo público.


JPT - Mas voltando para sua produção: como é seu método de trabalho?

Assis Brasil - Como sou - bom ou mau - romancista, sinto necessidade de um planejamento prévio da obra. Sem planejamento não poderia escrever.


JPT - Isso não tolhe a imaginação?

Assis Brasil - Não, pois o verdadeiro momento de criar á quando se tem a idéia. Depois, é trabalhar a idéia, de modo que se apresente lógica, pois no romance vige o princípio de causa e efeito. O que importa, entretanto, é o resultado final, isto é, se o livro é bom ou ruim. O modo como o romance foi escrito é algo que pertence ao domínio privado do autor.


JPT - O senhor reescreve muitas vezes?

Assis Brasil - No passado, sim; hoje, com o uso permanente do computador, posso refazer à medida em que escrevo; mas a intervalos imprimo uma versão, para testemunho e registro.


JPT - Acha importante a técnica?

Assis Brasil - Técnica literária - eis um sintagma diabolizado em certos meios cultos: é como se a literatura derivasse apenas da inspiração (sabe-se lá o que é isso), ou que a técnica fosse algo menor, própria dos obreiros manuais, dos carpinteiros e alfaiates. A verdade é outra: qualquer arte possui sua técnica. Tinham razão os arquitetos das catedrais góticas: ars sine scientia nihil est. Entendo a técnica literária como a soma das condições necessárias à escrita. É o senso de medida na frase, sua musicalidade, a perfeita construção do diálogo, a eficiência descritiva e narrativa e, em especial, a idéia de proporção da peça inteira, de modo que suas partes dialoguem com a necessária harmonia compositiva. Técnica também é não atrapalhar-se com as palavras; ao contrário, é fazer com que trabalhem a nosso favor. Técnica é entender o axioma: o que se corta, ganha-se - os leitores, aliviados, agradecerão essa higiênica providência. Técnica é saber que não se escreve para desabafar, mas para construir uma realidade estética autônoma, a ser fruída pelos leitores. Dominar a técnica é escrever de tal maneira que o leitor queira saber o que virá no capítulo seguinte. É, por isso, dizer algo novo a cada frase.


JPT - Então a técnica pode ser aprendida?

Assis Brasil - A técnica literária - assim com a técnica da pintura, da arquitetura, da música, etc., - pode ser conquistada num curso à semelhança dos laboratórios do texto (no Brasil, "oficinas"). Os laboratórios são uma experiência consagrada no mundo inteiro, e vêm obtendo crescente aceitação desde que foram criados nos Estado Unidos, a partir da década de 40 do século passado. Grande escritores saíram dali, e agora lembro Raymond Carver. O curioso, nesse sarau polêmico, é que não se discute a utilidade, por exemplo, de uma academia de dança. Pensado na raiz desses preconceitos e equívocos, percebe-se, subjacente, uma atitude algo elitista, algo reacionária, algo romântica, algo ingênua, que leva alguns autores a acreditarem apenas no talento, algo problemático, por dividir as pessoas entre talentosas e não-talentosas, partição inaceitável num mundo que se esforça para, sem discriminações, assimilar e a integrar as diferenças e as minorias. A propósito, há um interessante livro de Beth Joselow, chamado, muito significativamente, de Writing without the muse. (1995). Evoco, para ilustrar, a célebre crítica que Machado de Assis escreveu a O primo Basílio, na revista O Cruzeiro, em 16 de abril de 1878. Ali, pela primeira vez, foi dita em português, a expressão "oficina literária". A certo instante do texto - na verdade, uma desanda geral no colega português - diz Machado: "[Eça de Queirós] transpôs ainda há pouco as portas da oficina literária..." Por evidente não está a referir-se a esse fenômeno atual, mas alerta para a existência de uma técnica e para a necessidade de um aprendizado dessa técnica. E nem Machado furtou-se a isso.


JPT - Quais suas relações com a crítica?

Assis Brasil - Temos de distinguir: de um lado há a verdadeira crítica, que é uma peça de reflexão embasada num referencial estético-teórico, a qual analisa a obra mediante critérios ponderáveis e universalmente reconhecíveis; de outro lado, há a opinião, fruto muitas vezes da efemeridade do gosto, quando não de sentimentos derivados do compadrio ou, ao contrário, do preconceito. Recomendo ao escritor que leia a ambas; quanto à primeira, aprenderá bastante sobre a arte literária, o que poderá ajudá-lo a escrever melhor; quanto à segunda, acho-a ainda mais interessante, pois aprenderá, e muito, sobre a natureza humana - que é, afinal, a matéria-prima da Literatura.


JPT - Dentre sua obra, há algum romance de que o senhor goste mais?

Assis Brasil - Isso é o mesmo que perguntar a um pai de qual filho gosta mais; mas para não fugir à pergunta: As virtudes da casa é o romance que melhores lembranças me traz da época de sua escrita. Não sei se é o melhor, literariamente falando, mas é certo pertence ao inventário das minhas obras inesquecíveis.


JPT - Passando ao cinema. O senhor tem várias obras que passaram ao cinema ou estão em fase de passar. Como o senhor vê esse fato?

Assis Brasil - Com muita naturalidade. Se há algum mérito nisso, ele se restringe à circunstância de eu manter-me fiel a uma idéia: toda a narrativa deve possuir episódios, coisas acontecendo. Isso é cinema. Todo o romance deve despertar no leitor aquela pergunta sôfrega: "E agora? O que vai acontecer?". E é isso que se espera de um filme. Não me considero um purista quanto à fidelidade do filme ao livro. São duas modalidades diversas de narrativa. Se o romance pode ter maior liberdade em explorar as personagens e suas tramas, abrindo espaços para a reflexão, já o cinema deve ficar no "osso da história", pois é preciso compactar em hora e meia todo um universo narrativo. Sempre dei ilimitado poder aos adaptadores ou diretores dos filmes baseados em meus livros. Tal como no romance, importa é que seja um bom filme.


JPT - Alguns críticos acham que o senhor pratica o romance histórico. Concorda com isso?

Assis Brasil - O romance histórico tradicional, ao estilo de Scott e Herculano, não se pratica mais; pelo menos, se pratica pouco - e de má qualidade. No denominado "novo romance histórico" - que Linda Hutcheon chama de "metaficção historiográfica" -, a história é sempre pretexto, e é deformada, reinterpretada, discutida e, até, criada. Imagino ter feito, e com certa freqüência, essa segunda modalidade, com recurso à paródia, ao pastiche e, uma ou duas vezes, ao plágio burlesco. Penso, contudo, que é um capítulo encerrado em meu trabalho. Hoje me preocupa, mais que tudo, a ficção. Mesmo que os plots estejam situados num tempo pretérito, isso é apenas uma opção do escritor: o passado me dá maior liberdade criadora, e as emoções e paixões me parecem mais autênticas.


JPT - Valesca de Assis, sua esposa, também é escritora, e premiada, com três romances publicados. Há interação em família?

Assis Brasil - No plano afetivo e emocional, a mais completa interação; no plano literário costumamos a separar as coisas. Contudo, jamais publico algo sem que a Valesca tenha lido previamente. Suas observações são valiosíssimas e, às vezes, decisivas. Se consegui algo em minha trajetória de escritor, devo a esta mulher brilhante a ao mesmo tempo modesta, que me dá um sentido à vida e ao que escrevo. Creio que isso diz tudo.